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Foto do escritorCarol Campos

Rivalidade Feminina: quem ganha com isso?


Eu não sei você mas eu já escutei, mais de uma vez na vida, infelizmente, frases do tipo: “mulher não é amiga de mulher”, "amizade entre e com homens é mais sincera", "as mulheres não se arrumam nem para si nem para os homens mas para as outras mulheres", "as mulheres são invejosas, falsas e interesseiras", "àquela ali vai roubar seu namorado", entre outras afirmações desse tipo.

A rivalidade feminina é um mecanismo de defesa e sobrevivência tão antigo quanto o próprio patriarcado, que foi incentivado pela sociedade como uma forma de manipular e nos desunir. O patriarcado é a estrutura pelo qual homens oprimem mulheres e para que funcione efetivamente, precisa que o máximo de mulheres estejam envolvidas em sua manutenção, mantendo as práticas de misoginia e nos colocando em um ciclo de violência intra-feminina para nos manter desunidas, e assim subjugar à todas. Mas a maior parte das mulheres nem tem consciência que fazem parte do sistema pois foram socializadas assim e não sabem que podem "escolher" serem diferentes. Usando a cultura de rivalidade, desconfiança e micro-violências emocionais - e até físicas - mulheres são colocadas umas contra as outras, virando algozes de si mesmas.

"Quando brigamos e competimos entre nós mulheres, estamos a serviço do patriarcado..."

A rivalidade entre as mulheres é antiga e começa a ser perpetuada ainda na infância. Os meninos sempre andam em grupo, incluem mais pessoas, mas a coisa mais comum é ver as meninas andarem em duplas, no máximo trios. Essa menina mais adiante, quando olhar para outra mulher, ela vai sentir uma ameaça. Vai reparar no corpo melhor, no cabelo melhor, etc.


Seja em práticas cruéis como mutilação genital, em práticas mais “leves” como competições em concursos de beleza, ou de formas até mais inconscientes através da música e da literatura, mulheres são incentivadas a inferiorizar mulheres e competir pela atenção masculina.


Sobre essa competição pela atenção masculina, vou me referir aqui ao termo "dispositivo amoroso", conceito utilizado por Zanello (2018) nos estudos e pesquisas sobre gênero e construções de subjetividade. Esse conceito é usado enquanto categoria analítica para se pensar o processo de subjetivação de mulheres ocidentais na contemporaneidade. De acordo com a autora, dizer que as mulheres se subjetivam a partir do dispositivo amoroso significa revelar que sua autopercepção e relação consigo mesmas são mediadas pelo olhar e aprovação de um homem que as escolha. Ao homem é, portanto, dado o lugar ativo de quem avalia e escolhe. Enquanto à nós mulheres é dado o lugar desempoderador e vulnerável de ser validada, desejada e escolhida, em detrimento de outras mulheres. A metáfora criada por Zanello (2018) para retratar essa dinâmica é a "prateleira do amor": esse lugar simbólico em que a mulher, por meio do ideal estético (branco, jovem e magro) e da relação de rivalidade com outras mulheres, deve se fazer passível de ser escolhida.


"Ser escolhida é sempre um valor relacional, ou seja, produzido na comparação com outras mulheres disponíveis também nessa prateleira simbólica". (Zanello, 2018)

Vídeo 1 (Terroristas de gênero)- Tirinhas sobre a PRATELEIRA DO AMOR

E entendendo essa questão da prateleira do amor, da nossa necessidade de sermos "escolhidas"e assim, obviamente, termos as mulheres como rivais nessa prateleira, dá para "entender"um pouco mais o motivo de vermos mulheres incríveis se digladiando por algum homem. Normalmente, são mulheres inteligentes, simpáticas, bonitas, que se sustentam, que têm múltiplos interesses e talentos, muitas vezes sofrendo horrores e criando inimizades sem sentido por um homem com um total de zero atributos que está mais se divertindo, sentado, vendo sua atenção ser disputada com tanto afinco.


Em julho de 2017 foi ao ar uma cena muito emblemática na novela "A Força do Querer", da Rede Globo. Nela, as personagens Irene (Débora Falabella), a amante da história, Joyce (Maria Fernanda Cândido), a esposa, e Ritinha (Isis Valverde), que é nora de Joyce, se atracaram em um banheiro por causa de Eugênio (Dan Stulbach), o marido em questão, que nem estava presente. Esse núcleo proporcionou a cena de maior audiência dessa novela e, considerando que essa criação da autora Glória Perez foi a novela mais popular dos últimos quatro anos anteriores (2014-2017), o resultado foi bastante significativo para a emissora. O problema é que esse enredo de mulheres brigando entre si e competindo não se restringe somente à ficção:



A antropóloga Cecília Patrício explica que essa disputa entre mulheres é algo que sempre existiu, embora fosse mais sutil enquanto as relações eram mais desiguais e os espaços e papéis melhores definidos. Ela acredita, no entanto, que as mulheres acabavam odiando outras em nome da tentativa de segurar seus parceiros, e ilustra com a relação entre senhoras das casas grandes e as escravas que se envolviam com os senhores.


Cecília Patrício ressalta que a rivalidade entre mulheres vem desde os tempos do Brasil colônia, quando nasceu a dicotomia 'puta e pura':


“Tinha a mulher, mãe e dona de casa e a mulher da rua. Dois esteriótipos bem fortes para a mulher colonial. E elas encaravam esses esteriótipos e agiam com força diante de qualquer ameaça. Muitas vezes entendo essa inimizade entre mulheres como uma questão de conquista, luta de forças de quem pode conquistar e manter mais e melhor aquele homem. Já eles têm mais autoestima, por serem machos", explica a antropóloga, que acredita numa relação com a natureza masculina, mas aponta sobretudo a formação das pessoas. "Veja os brinquedos de meninos e meninas. Os deles são de poder, engenharia, força, atitude. Os de meninas são de contos de fadas, princesas, reinos que não existem, panelas, que remetem o ideal de cuidado que se impõe".

Insegurança X Rivalidade Feminina

A conquista de uma boa autoestima é um passo fundamental para deixar de lado a insegurança – seja em relação a si própria, seja na relação com outras mulheres. Pensando nisso, a estudante de fotografia Juliana Bandeira, 22 anos, idealizou e pôs em prática o projeto Espelho Meu, que propõe um mergulho na beleza feminina. A ideia é livrar as mulheres da “cegueira” imposta pelo padrão de beleza massificado, mostrando a elas - e ao mundo - a beleza que existe em todas as mulheres.


Desvalorização do feminino na sociedade

No contexto de desvalorização do feminino e supervalorização do masculino em que frases do tipo “você não é como as outras” parecem elogio. É preciso muita desconstrução pra perceber que essa desunião feminina é tiro no pé. Ah, então, a gente precisa apoiar e amar todas as mulheres como se todas fossem santas? Claro que não... mas é preciso contextualizar e pensar duas vezes antes de ver como inimiga alguém que não nos fez nada é importantíssimo.




Competitividade em diferentes espaços

A competitividade entre nós está presente no dia-a-dia e em diferentes espaços. Da escola ao mercado de trabalho e entre todas as classes sociais. A rivalidade entre mulheres é incentivada e normalizada. A mídia a todo tempo nos coloca em disputa e rivalidade. Como não lembrar, por exemplo, de Xuxa e Angélica, Rihanna e Beyoncé, Ivete e Claudia?


Na música:

“Prepara que agora é a hora Do show das poderosas Que descem e rebolam Afrontam as fogosas Só as que incomodam Expulsam as invejosas Que ficam de cara quando toca Prepara Se não tá mais a vontade sai por onde entrei”


Na Literatura:

Isso começa antes que a gente aprenda a falar. As histórias infantis trazem a imagem da disputa entre mulheres, principalmente quando o “Príncipe Encantado” é o prêmio. Quem não lembra da Madrasta da Cinderela, que colocava as irmãs contra a gata borralheira numa corrida louca para encontrar um bom marido?



Sororidade


A ideia de um pacto de proteção e acolhimento entre mulheres ganhou força com o feminismo contemporâneo no Brasil. No país que registra um estupro a cada 11 minutos e onde 13 mulheres morrem violentamente todos os dias, acabar com a rivalidade entre nós não só desarticula um dos mais fortes alicerces do patriarcado, mas se coloca como estratégia de sobrevivência.



"É importante a gente entender que esse ódio é uma construção social também, meus amores. Eu não odeio mais essas mulheres e hoje entendo o motivo pra já ter odiado. Peço perdão aqui a todas pelo ódio que demonstrei e as que me fizeram algum mal, perdôo de coração. Levante a hashtag #ParaTodasAsMulheres para também pedir perdão e perdoar outras mulheres."

Que tal trabalharmos para romper o ciclo da rivalidade feminina e nos apoiarmos?


Vale lembrar o vídeo da campanha Together Women Can, que traz algumas celebridades como Selena Gomez e Emma Watson falando sobre figuras femininas que as inspiram. O objetivo é mostrar às mulheres o poder que elas têm quando apoiam umas às outra. Confira:


Por fim, fica uma reflexão que li recentemente e que tanto me marcou e que realmente acredito:

Não somos naturalmente inimigas, e juntas seremos a revolução. É isso que eles tanto temem.


Para saber mais:

Que tal ouvir um Podcast do Poder Feminino intitulado Rivalidade Feminina?


Para acessar o podcast: clique aqui.


Desde criança nós mulheres, fomos criadas pela sociedade para ver a outra mulher como uma rival. Se não é nossa amiga, nossas irmãs, a outra mulher é rival. Namorada de amigo, amiga de amiga, a menina nova na escola ou a nova colega de trabalho. A primeira reação que temos é ver ela como uma inimiga. Ainda bem que com a evolução da sociedade, o aumento de debates sobre feminismo, esse pensamento, aos poucos, tem mudado. Mulheres estão refletindo sobre o assunto e parando de ver a outra mulher desconhecida como uma inimiga e sim, vendo como aliada. E esse é o assunto do podcast de hoje: RIVALIDADE FEMININA. A convidada é a psicóloga Natália Marques.


Livro: Vamos juntas? – O guia da sororidade para todas


Esqueça as mentiras que te contaram. As mulheres não são falsas, não são rivais, invejosas ou interesseiras. Nada disso é intrínseco à condição feminina. Assim como os homens, as mulheres experimentam todos os tipos de sentimentos, sejam eles bons ou ruins. Pense em alguém que estaria ao seu lado em um momento delicado de sua vida. Qual a possibilidade de ser uma mãe, uma irmã, uma amiga, uma mulher? É esse o convite que a filósofa Márcia Tiburi faz no prefácio do livro Vamos juntas? – O guia da sororidade para todas, da jornalista Babi Souza. Com linguagem simples e didática, a autora quer apresentar às leitoras um dos conceitos básicos do feminismo que joga por terra o mito da rivalidade feminina. Sororidade é “olhar carinhoso para outra mulher”, “a união e a aliança entre mulheres para alcançar objetivos comuns”, “enxergar outra mulher como irmã na luta por direitos iguais”, “versão feminina da palavra fraternidade”.

Matéria sobre o livro: clique aqui.

Livro na Amazon: clique aqui.


Vídeo: Valeska Zanello fala sobre "a prateleira do amor".


Referências:


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